segunda-feira, fevereiro 26, 2007

Encontrei-a... num naufrágio


O mar voltou num olhar, mudando
a cor da onda que aqui o trouxe
ontem foi verde, hoje é castanho
esse teu olhar amargo semi-doce





Encontrei-a sem querer, querendo
numa esquina de um velho prédio
onde um olhar me deixou tremendo
com o silêncio que esconde o mistério





tu estavas ali outra vez
e mais uma vez sem querer
e eu queria ali estar e não era capaz
calado, incapaz de dizer...
tu foste, tu eras...
e agora tanto te faz





e tudo fica assim...,
tu por ai e eu aqui
agora sem entretanto, lamento ou engano
eu grito, tu não dizes, ele chora e ela ri
nós fomos, eles eram...,
eu e tu...,
quem sabe
... num outro sonho















quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Senhora de Gouvarinho



" Acordo sem o contorno do teu rosto na minha almofada, sem o teu peito liso e claro como um dia de vento, e começo a erguer a madrugada com as duas mãos que me deixaste, hesitante nos gestos, porque os meus olhos partiram nos teus.
E é assim que a noite chega, e dentro dela te procuro, encostado ao teu nome, pelas ruas álgidas onde tu não passas, a solidão aberta nos dedos como um cravo.Meu amor, amor de uma breve madrugada de bandeiras, arranco a tua boca da minha e desfolho-a lentamente, até que outra boca - e sempre a tua boca - comece de novo a nascer na minha boca.
Que posso eu fazer senão escutar o coração inseguro dos pássaros, encostar a face ao rosto lunar dos bêbados e perguntar o que aconteceu."


(Primeiramente - Eugénio de Andrade)

segunda-feira, fevereiro 05, 2007

Peço ... o que não vejo, um momento















Peço o que não vejo
a quem o não tem
E dou-lhe asas
quando ela quer voar
Não sou ninguém,
mas um dia fui alguém
Á sombra de uma estrela,
naquela praia junto ao mar
















Desisti de tudo aquilo
que não tinha sido
Para passar a ser

aquilo que não sou
Mas nem tu
sequer meu amigo
,
encontraste-me
quando estava perdido
Nas lágrimas do chorar
de quem junto mar...,

ali chorou












Rezo a um deus
mesmo sem saber rezar
E tento
encontrar
aquilo que ninguém encontrou
Estava perto na planície...,
o deserto que virou
mar
Onde aquilo que talvez sendo,

de certeza o não sou
















São fugazes momentos
de inspirada loucura
Pintados por Picasso

numa tela de Dali
É uma doença curada,
que talvez não tenha cura

Perdida
que ficou,
junto aos rios do Mali








São retalhos vazios
de uma vida qualquer
Contos e lendas
na boca de mil pastores

Histórias de ontem,
que hoje ninguém quer
Escondidas entre mil medalhas,
presas a mil louvores
















Mas o riso da criança
virou pedra no jardim

E pressupõe-se a ganância,
como um mero posto
De algo que vai crescer...,
no começo do princípio do fim
De uma esperança a esmorecer,
nas linhas do meu rosto

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Agoras de outrora...



Acto n.º ... ,
Hum, já não me lembro...

.


.

.


"
(...)

Meditei, enquanto tu foste levá-la ao autocarro, embora isso seja presunção minha, visto que disseste que ela ia para casa…
Depois vi-te lá fora exposta a uma aragem já de certa forma outonal, olhando para longe.....
- O que é que estavas a fazer ? - perguntei-te quando chegaste.
- Estive a pensar - respondeste, bebendo de seguida e com um movimento brusco o que restava da tua cerveja
- Então pensa lá. Mas não fiques com essa cara de Outono.
- Deixa-me ...
- Deixo-te !?!
- Sim, deixa-me...., deixa-me pensar que sou só e que tudo posso, e que as reponsabilidades se extinguiram naquela esquina que ficou lá embaixo, e quando aqui entrei..., que a vida se comporta conforme as marés e não segundo os ditames daquilo que me rodeia e que mais odeio.
- Desculpa se disse algo.
- Não..., tu não disseste nada..., tu nunca dizes nada !!
- Olha lá, porque é que eu estou a sentir que estás a querer dizer alguma coisa. Se o queres di-lo.
- Assim como tu, que dizes tanto e nada dizes apesar de dizeres tudo...., sabes, tu és quem tu dizes ser, mas não consegues vestir com palavras aquilo que te vai na alma, nem sequer consegues desenhar com as mãos aquilo que crias no coração.
- Mas o que é que se passa !?!, Porque é que estás tão séria..., aconteceu alguma coisa com a tua amiga !?!
- Tu só crias dúvidas aonde deviam existir certezas.
- Mas espera lá, o que é que se está aqui a passar, a quem é que tenho que agradecer esse teu discurso tão preenchido por dúvidas existenciais sobre a minha pessoa e as minhas atitudes. Para onde me queres levar hoje !?! Não sei se me agrada o local aonde me queres levar a passar a tarde.
- Gostava de te levar para um local aonde fosse abundante a coragem e o silêncio tivesse uma linguagem tangível e sonora, gostava que a vontade de gritar cuja falta me atormenta encontrasse eco no teu coração e voz na tua boca. Pois se for certo que estas dúvidas também te assaltam, então a seara que se desenha em nosso redor está condenada a ser infértil,vazia...,um deserto de dúvidas que não produzem fruto de qualquer espécie, antes me atormentam e te debilitam.
- Estás a chamar-me de cobarde porque pensas que sou ou porque vês-me como reflexo de um espelho a quem tu chamas de Mar !?!
- Tou a chamar-te cobarde porque tu o és !! Porque queres que tudo seja simples e que o cinza se transforme em azul como o sol substitui a lua. Mas não fazes nada. Ou pior, falas sobre o meu riso, trazes-me rosas, dizes que o Sul foi uma onda de prata que invadiu as nossas vidas.
Então ela humedeceu os lábios.....
- Uma onda de prata !!!!!
Este assomo de franqueza aliado a palavras que me queimavam como ferro em brasa, fizeram com que ficasse cada vez mais calado
- E então, diz-me o que mais fizeste ?
- Eu......
- Diz o que mais me disseste ?
- ...
- Porque é que hoje não me tocaste...., não me beijaste.
- ....e tu !?! - sussurei por entre dentes !!
- Eu..., eu sinto-me sozinha....perdida entre dois mundos, fraca e cinzenta..., cobarde.... orfã de quem por mim lute, de quem me puxe para perto dele e me aconchegue. Sinto-me orfã de um banco de jardim onde duas pessoas se amam com o simples estar entre um livro que se lê e um rosto que descansa nas pernas de alguém.
- ...

(...)
"